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Com mais de 43 anos como docente no ensino secundário, nos quais desempenhei muitos cargos pedagógicos, decidi reformar-me. Os motivos por que o fiz têm a ver com as mudanças que o tempo presente impõe no estatuto do professor e algum desencanto. A decisão foi despoletada com o advento da pandemia.
Cerca de nove em cada dez professores admitem querer reformar-se de imediato, se tal oportunidade lhes fosse proporcionada.
No meu caso, já tinha ultrapassado o tempo necessário para tal, e estávamos há dois meses em aulas online devido aos surtos pandémicos. Tinha a minha oportunidade, agarrei-a sem pensar muito.
Contudo, tal ideia já estava amadurecida há algum tempo. É ainda durante a vida ativa que um professor deve preparar a passagem para a reforma.
Tive desde sempre outros interesses:
Para preparar a transição realizei, cerca de 2 anos antes, um curso de fotografia e integrei-me num grupo de fotógrafos, fazendo tertúlias semanalmente, assim como no grupo Urban Sketchers.
A reforma chegou em onze dias. Apesar de ter pensado e preparado este processo, fiquei abalada pela notícia, pois esperava num prazo otimista, que demorasse quatro a cinco meses… Com o facto consumado, tratei de dar trabalho aos portáteis, às tintas e pincéis, à máquina fotográfica e manter um ritmo de trabalho que não mais parou até agora.
E assim, ao fim de três dias tinha ultrapassado o “choque”.
Com a reforma, ganhei tempo para outras coisas.
Sinto-me mais livre para outras atividades.
As formações online foram uma constante e novos desafios foram aparecendo. Vou aceitando todos com agrado e entusiasmo.
O que senti que era importante era manter-me sempre com muita atividade.
Rejeito ver a reforma apenas como um momento difícil. Tem que ser um momento vivido como uma passagem para um resto de vida, muito rico em ações.
Defendo que é preciso encontrar estratégias para que antigos professores, se assim o desejarem, possam continuar a contribuir, com a experiência acumulada, para aquilo que fizeram. Há projetos possíveis de levar a cabo dentro das escolas, em regime voluntário, mas nem sempre há grande recetividade.
A meu ver, a reforma não significa um ponto de partida para o envelhecimento. Nem para a vivência de alguns anos de descanso.
Para muitos, significa o início de um novo ciclo ou de um novo projeto.
O fundamental é que a pessoa consiga redefinir um lugar para si, onde se sinta satisfeita e realizada tanto social como pessoalmente.
A identidade pessoal persiste e evolui independentemente da passagem à reforma, uma vez que há uma expansão dos papéis anteriores e desenvolvimento de novos papéis, de forma a canalizar o tempo livre em atividades e projetos diversificados.
Concordo com Mia Couto quando questiona:
“Afinal, o que é a idade? Quando eu era jovem uma pessoa de 50 anos era velha. Eu tenho 60 e apenas em certos momentos percebo que me pesa a idade. É por uma atitude interior, uma vitalidade que se alcança pela capacidade de fazer amigos, de amar e ser amado e de ser dono do sentido de tempo.”
Eu acrescentaria: manter a atividade, ter sonhos, realizar projetos e continuar a aprender.
Cidália Aguiar é uma Reporter 60+. Saiba o que é, aqui na nossa entrevista com Silvia Triboni