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Por todo o país, multiplicam-se iniciativas de ajuda e solidariedade e também de muito engenho por parte de todos. Neste caso particular, estamos a falar da área de Ciência e Tecnologia. E da solução para a criação de produtos e teste para o combate do Covid 19. Com produção portuguesa.
Este texto foi retirado de uma partilha feita por Jorge Buescu através de um post colocado nas redes sociais. Foi dada permissão pelo autor para partilha e por isso estamos a fazê-lo, integrando na nossa área de opinião.
O texto está reproduzido na íntegra.
“Tive hoje uma longa conversa com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor que me encheu de esperança nestes tempos particularmente sombrios. Sobretudo por ver que, no meio do caos, há quem consiga ter visão e esteja a tirar partido daquilo que Portugal tem de melhor nos campos da Ciência e Tecnologia”. Manuel Heitor está a envolver activamente a comunidade científica e tecnológica portuguesa – que tem enormes capacidades, como ontem descrevi – para a mobilização geral nesta guerra.
Vou tentar descrever algumas das frentes nesta batalha muito menos visível, mas talvez não menos importante, do que a frente estritamente médica. São notícias desta frente de batalha que trago hoje.
Manuel Heitor, em estreita colaboração com outros membros do Governo e líderes de instituições científicas, está a proceder à identificação e valorização de um conjunto de iniciativas e projectos de base científica e tecnológica com implementação imediata e eficaz para entrarem em acção nesta guerra. Serão as nossas “armas secretas” para esta guerra.
Eis os exemplos mais impressionantes.
1. O teste de diagnóstico por PCR implementado pelo Instituto de Medicina Molecular (IMM) (que ontem descrevi no post “Testes: a solução está em Portugal”) está certificado e validado pelo Instituto Ricardo Jorge e está pronto para entrar em acção. Usa reagentes produzidos em Portugal pela empresa de biotecnologia NZYTech. O teste do IMM permitirá ainda estimar a carga viral, que poderá ser relevante na avaliação do prognóstico clínico.
2. Um dos materiais em falta para a implementação dos testes tem sido a falta de zaragatoas. A Iberomoldes, da Marinha Grande, sob a liderança de Joaquim Meneses, reconverteu a sua linha de montagem no espaço de um dia de forma a produzir zaragatoas. Na próxima segunda-feira deverá dispôr de 40.000 para entrega imediata.
3. O teste do IMM vai ser produzido em grande quantidade e o objectivo é que seja aplicado em unidades próprias por todo o País. A aplicação dos testes aos lares de idosos é muito importante e particularmente critica e urgente. Está a ser implementada em coordenação directa com a Ministra do Trabalho e Segurança Social (MTSS), Ana Mendes Godinho, e com a Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) em articulação com a Segurança Social. Exige uma operação muito sensível de logística, para recolher amostras e aplicar as medidas necessárias de isolamento dos idosos contagiados. Estão a ser recolhidos apoios de mecenas e voluntários pelo MTSS.
4. A tradição portuguesa nas Biociências está mais ligada à área da Imunologia, não da Virologia. No entanto, outras unidades de investigação de excelência (IGC, ITQB, CEDOC) estão a reorientar a sua investigação com efeitos imediatos para poder ajudar nesta luta.
5. A Biosurfit, empresa portuguesa de Biotecnologia sediada na Azambuja, em particular dispositivos médicos e testes PCR, reorientou a sua actividade para o desenvolvimento de novo processo de triagem “SMART”, que está já em implementação Hospital de campanha instalado na Cruz Vermelha Portuguesa e arrancará na segunda-feira. Este sistema permite antecipar a detecção dos processos de maior risco ainda antes de o paciente ter marcados problemas respiratórios, facilitando a prevenção da propagação do COVID: um dos grandes problemas deste vírus são os pacientes “invisíveis”, que estão espalhados pela população sem noção de que estão infectados e contagiosos.
6. O CEIIA, centro de Engenharia e Desenvolvimento de Produtos sediado em Matosinhos e virado para a indústria aeronáutica, onde trabalha mais de uma centena de engenheiros aeroespaciais, foi reconvertido para realizar o desenvolvimento de ventiladores invasivos, em estreita colaboração com a Escola de Medicina da Universidade do Minho e a indústria. A capacidade de produção é de 100 ventiladores até ao final de Abril, 400 até ao final de Maio e, caso seja necessário, 10.000 até ao final do ano. (Da próxima vez que me vierem dizer “mas para que é que Portugal precisa de engenheiros aeroespaciais?”, já sei o que responder). Para o transporte dos materiais necessários está a ser mobilizada a linha logística da SONAE.
7. Embora a indústria têxtil e de vestuário seja forte em Portugal, ela está virada para a moda. Em particular, em regime normal Portugal não produz material para utilização médica (luvas, batas, máscaras, fatos isolantes) tendo de o importar. O CITEVE (Centro de Centro Tecnológico Indústrias Têxtil Vestuário de Portugal) reorientou a sua actividade para o desenvolvimento e produção destes Equipamentos de Protecção Individual, estando em estrita colaboração com a indústria, estando toda a operação a ser conduzida em estreita articulação com o Ministro da Economia
8. Finalmente, é muito bom saber que a FCT está a apoiar a DGS na preparação de uma plataforma de dados de acesso aberto. A DGS não tem neste momento os dados organizados e codificados de uma forma que permita o seu tratamento com as ferramentas da Ciência de Dados, permitindo extrair toda a informação relevante. E sem informação sobre o inimigo dificilmente poderemos ganhar a guerra.
É este o caminho. Temos competências em Portugal, temos inteligência em Portugal, temos Ciência e Tecnologia em Portugal, temos indústria em Portugal. Temos tudo! Falta apenas colocar as rodas em movimento.
Foi muito repetido que este é um estado de guerra; mas ainda não construímos uma economia de guerra. Mobilizemos tudo o que o País tem de melhor, recrutemos cientistas, inventemos tecnologias, reorientemos indústrias. Este é uma guerra que o Estado sozinho não pode ganhar. Temos de mobilizar a sociedade civil e saber aproveitar tudo o que ela tem para dar.
No meio do caos, há algumas razões para esperança. O tempo urge.
Corações ao alto!
Jorge Buescu, 28/3/2020