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Os cuidadores, formais ou informais, são seres humanos. Não são super-humanos nem supra-humanos. São seres humanos. E por o serem, têm sentimentos, emoções, pensamentos e opiniões. Têm uma razão de ser e de estar. Têm uma forma de ser e de estar. Têm um afeto no ser e no estar. Eram assim antes de cuidar de alguém e continuam a sê-lo depois de começarem a cuidar de alguém. E quando se começa a cuidar de alguém, por maior que seja o compromisso e a entrega, há que ter muito presente todos os limites: Os nossos, os do compromisso, os da entrega, os do dever e da obrigação, os da retribuição…. E tantos outros que, como estes, também entram no jogo de enumeração dos deveres, esquecendo, quase sempre, os direitos do cuidador.
Se acerca dos deveres parece claro que cuidar é, entre outros, tratar, acarinhar, zelar, estar, ser, acompanhar, aconselhar, escutar, ensinar, aprender… Não é uma missão. É um compromisso. Profissional ou sem ser profissional, é um compromisso e que deve ser levado a cabo com toda a eficácia e o todo o humanismo. Não os possíveis, mas os exigidos para uma prestação de cuidados de qualidade que gerem qualidade de vida e bem-estar. Mas a este propósito não há grandes questões e aparece escrito – e bem escrito – em vários e diversos documentos formais e informais.
É com o cuidador que me preocupo. Porque se há uma lista bem clara acerca dos seus deveres, não são tão claros os seus direitos. E ainda menos claros quando se trata de cuidadores informais. Os filhos que cuidam dos pais, os pais que cuidam dos filhos, o irmão/ã que cuida da irmã/o, a sobrinha que cuida do tio, o neto que cuida da avó… Se os laços familiares que unem as pessoas criam relações de significado – amor, amizade, história, vida –, criam também o sentido de responsabilidade para cuidar. E nada disso seria preocupante, se com esse compromisso não viesse implícita uma exigência de deveres sem direitos. Sem direito a descansar, sem direito a dormir, sem direito a vontade própria, sem direito a sonhar, sem direito a existir. E os direitos, que lenta progressivamente se vão perdendo, vão esgotando o cuidador, envelhecendo-o, deteriorando-o e, principalmente, aniquilando-o… sendo que a cada dia que vai passando, se torna cada vez mais difícil a entrega e o compromisso, a eficácia e o humanismo. E porque parece ser um dever sem direitos, o cuidador perde-se e deixa de saber quem é, o que faz ali e porque o faz… e apenas anseia pelo dia em que deixará de o fazer, em que deixará de o ser. O dia em que se libertará do jugo de cuidador ao qual o confinaram.
Cuidador do cuidador
Um cuidador nestas circunstâncias, com tal eficácia, humanismo e esperanças não me parece que se tenha tornado num bom cuidador. Não que não fosse bom. Até era muito bom cuidador, mas deixou de o ser. Mais correto será: as nossas exigências destruíram o muito bom cuidador.
Acontece… e porquê? Porque nos esquecemos que os cuidadores são seres humanos. Seres humanos que sentem, que pensam, que opinam. E que têm uma vida. A sua. E que essa vida, mesmo quando existe o compromisso e a entrega no cuidar, precisa de se cuidar ela mesmo.
Só pode cuidar quem é cuidado, e bem cuidado (ver caixa). Mas, por vezes, não chega, porque a obrigação da eficácia num compromisso, que se exige permanente e contínuo, não tem em conta que para um cuidador se manter humano e humanizante, deve manter a sua humanidade e o seu humanismo. Para tal, há que começar por olhar para o cuidador como um ser humano que tem deveres, mas também um direito fundamental: o de continuar um ser humano. Mas, antes de tudo o mais, é o cuidador que deve saber cumprir os seus deveres, e, principalmente, defender os seus direitos que lhe permitirão cumprir os deveres com humanismo e eficácia. E só assim cuidar poderá proporcionar bem-estar e qualidade de vida… ou não?
Como cuida de si o cuidador?