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Teria 15 ou 16 anos, altura em que como bom adolescente sabia tudo, uma resposta simples do meu pai marcou-me para sempre. Palavras que só entendi verdadeiramente anos depois.
O meu pai era uma pessoa humilde e simples, que abandonou a escola antes dos 9 anos para trabalhar e poder ajudar a família. Mas o que lhe faltava em instrução tinha em bom senso e sabedoria. Ao contrário de outros falava pouco e acertava muito.
Dedicou toda a sua vida aos 5 filhos, sacrificando-se para que estes tivessem a formação e as possibilidades que a vida lhe tinha negado a ele. E assim continuou a fazer mesmo quando os filhos já não necessitavam do seu sacrifício e queriam retribuir-lhe, pelo menos um pouco, do que ele havia feito por nós. Mas teimava no seu princípio de que “devem ser os pais a ajudar os filhos e nunca o contrário”
As palavras que me marcariam foram ditas relembrando um episódio acontecido na minha infância e que marcou a minha relação difícil com o mar porque se haveria de repetir 1 vez mais: Quando tinha 3 ou 4 anos, na minha praia de infância, a praia da Adraga, os meus primos, mais velhos do que eu, levaram-me para a água pela mão. Fugiram com uma onda maior mas eu fiquei lá aos tombos. Quando veio o nadador-salvador já o meu pai se tinha atirado ao mar e me retirado.
A única memória que tenho do evento é a de estar deitado na areia e ver muita gente à minha volta. Só muito depois me contaram que me tiveram que extrair água e reanimar.
Lembrando esse episódio e com a minha “sabedoria” de adolescente que sabe tudo (amplificada porque estávamos em plena revolução e eu era muito ativo politicamente), disse ao meu pai que ele “tinha sido inconsciente porque não sabendo nadar podíamos ter morrido os dois afogados”. O meu pai respondeu-me simplesmente “nem me lembrei se sabia nadar ou não, era o meu filho e tinha que o ir buscar”
Claro que achei a resposta corajosa e não me esqueci dela, até porque já tinha uma admiração grande por ele. Mas só entendi verdadeiramente o seu significado no dia em que segurei o meu filho mais velho nos braços. Foi aí que percebi que eu faria exatamente o mesmo por ele, se fosse necessário.
Foi com esta e outras lições que percebi que pai e progenitor podem ser coisas diferentes. Pode ser-se pai e não ser progenitor e pode ser-se progenitor e não ser pai.
Infelizmente, hoje muita da educação dos filhos é feita pela internet e fora de casa. A pretensa “sabedoria” dos adolescentes aumentou embora a sua autonomia tenha diminuído. A transformação de um progenitor em pai dá hoje muito mais trabalho.
Sem desprimor para outros, eu tive um progenitor que foi o melhor pai do mundo.