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Apesar de os números terem ajudado a traçar um retrato claro do envelhecimento em Portugal – o terceiro país mais envelhecido da União Europeia e o quarto do mundo – as palavras da mais de uma dezena de especialistas do Fórum “Transição para a Reforma” apontaram uma perspetiva otimista sobre a longevidade.
As vantagens que o mercado de trabalho pode colher de colaboradores mais velhos e a valorização dos percursos de vida foram alguns dos destaques dados pelos oradores, que deixaram também desafios às empresas e organismos públicos para encontrarem respostas dedicadas a esta geração.
Filipe Almeida, Presidente da Estrutura de Missão Portugal Inovação Social, foi um dos primeiros oradores e deixou claro: “a longevidade não é um problema, a longevidade é uma solução, é uma conquista civilizacional e da ciência”. “O envelhecimento da população, em bom rigor, também não é um problema. É um desafio. Agora, o isolamento, a exclusão social, a deterioração física e cognitiva, as múltiplas iliteracias, incluindo a financeira, a doença, o medo, a ausência de projeto de vida, a dificuldade de criar núcleos interpessoais…isso são problemas”, acrescentou o responsável da Portugal Inovação Social.
Filipe Almeida reconheceu ainda faltarem soluções: “é fundamental desenvolver respostas inovadoras, testar e experimentar outras soluções para dar resposta aos idosos de hoje, mas também aos idosos de amanhã”.
Também Fernando Paulo, vereador da Educação e da Coesão Social da Câmara Municipal do Porto, refere a necessidade de respostas nacionais:
“Temos uma Secretaria de Estado da Juventude, temos uma Secretaria de Estado da Igualdade, na anterior legislatura, até tivemos uma Secretaria de Estado para a Inclusão do cidadão com deficiência, mas não temos de facto uma Secretaria de Estado, por exemplo, para as questões do envelhecimento e dos idosos”.
O autarca referiu diversos programas criados pela Câmara Municipal do Porto para os seniores, mas manteve a necessidade de ir mais longe para repensar a resposta nacional ao envelhecimento: “acho que a unidade da Missão para a Inovação Social fez mais neste país, na área de políticas sociais do envelhecimento, por exemplo, do que a Segurança Social”. “As respostas tradicionais não respondem, na área do envelhecimento, àquilo que são as necessidades de hoje”, acrescentou.
Sob moderação de Júlio Machado Vaz, a conversa sobre o papel dos mais velhos no mercado de trabalho estendeu-se pelos dois painéis da tarde – “Portugal está a envelhecer” e “Desafios na transição para a reforma”.
Isabel Dias, Professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, reconheceu a necessidade de desconstruir o conceito de envelhecimento e as “representações idadistas”.
“Eu não olho para o envelhecimento como um problema, no sentido de que vá comprometer o desenvolvimento das nossas sociedades”, afirmou
Para além de ver as gerações mais velhas como a “categoria social mais diversificada”, pelos trajetos e histórias de vida, a docente refere que as empresas têm de ver o conhecimento experiência acumulados “como ativos e têm de continuar a investir neste capital social”.
“As pessoas mais velhas são o único recurso natural em crescimento”, rematou.
A ideia de valorização do “espólio” pessoal foi também reforçada na intervenção de Maria Antónia Cadilhe - investigadora na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto que abordou o facto de hoje as carreiras serem um “processo de aprendizagem” com mais “pontos de mudança”, sejam eles desejados ou impostos.
Afirmou, por isso, ser necessário “ajudarmos as pessoas, independentemente da idade, a terem estratégias para desenhar e redesenhar possíveis carreiras”, destacando o papel que as empresas devem assumir nesse desenvolvimento e percurso das pessoas/colaboradores.
“As empresas têm um papel fundamental que é criar mecanismos para que haja essa cooperação e interação”, afirmou Maria Antónia Cadilhe, mencionando a necessidade de programas como as duplas de formadores intergeracionais ou o reverse mentoring, que promovam o reconhecimento das pessoas mais velhas e as incentivem a manterem-se ativas – algumas mesmo após a reforma.
Noutro painel, o Vice-Presidente Executivo da AIMMAP, Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal, Rafael Campos Pereira, reforçou também que as gerações mais velhas “têm mais sensibilidade, mais bom senso, mais experiência para enfrentar um conjunto enorme de desafios que se colocam neste momento”.
O responsável da AIMMAP afirmou que “não faz sentido” o preconceito face à idade que ainda persiste no mercado de trabalho: “não faz sentido dizer «eu não contrato uma pessoa de 60 anos, porque não há um compromisso de médio-longo prazo» e vou contratar uma pessoa de 25 anos. Na verdade, a pessoa de 25 anos, provavelmente, oferece menos compromisso e menos garantias de uma permanência perene na empresa”.
Ao debate sobre as mudanças no mercado de trabalho, Luís Antunes, Professor do Departamento de Ciência de Computadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, acrescentou a visão sobre o papel da tecnologia. “Eu acho que o emprego que vai prevalecer é a criatividade, porque a robotização e a inteligência artificial vão substituir tudo o que é mecanizável”, afirmou.
“No digital, claramente é possível nós conseguirmos mudar”, disse ainda o docente, que alertou, no entanto, para o facto de uma “correção profissional” (reskilling) não dar “a mesma capacidade de alguém que toda a vida foi treinado” para algo.
Luís Antunes deixou ainda um outro alerta: “estamos a construir uma sociedade em que, mesmo pessoas que são literadas digitalmente, mas não conhecem a tecnologia, começam a ter aqui um défice”, afirmou, reconhecendo ainda que “a próxima geração vai ter um mundo pior do ponto de vista dos direitos, liberdades e garantias”.
Coube a Nelson Machado, CEO do Negócio Vida e Pensões e Membro da Comissão Executiva do Grupo Ageas Portugal, a temática da preparação para a reforma, afirmando “10 a 15 anos é pouco” para que seja feita. Sublinhou a importância da poupança: “o impacto lateral muito positivo deste pequeno aumento individual da poupança de cada um de nós seria o aumento da poupança do país”.
A preparação para a reforma, as estratégias de poupança, o combate à fraude e a capacitação digital com maior segurança são alguns dos grandes objetivos do programa “Eu e a Minha Reforma”, criado pela Fundação Dr. António Cupertino de Miranda para as pessoas com mais de 55 anos. Até hoje, integraram estas ações de formação periódicas mais de 1.400 participantes dos municípios do Porto, Maia, Matosinhos, Santo Tirso, Valongo e Vila Nova de Gaia.
O projeto, que concluirá no final de 2022 três anos de apoio do Portugal Inovação Social, através do Fundo Social Europeu, está a ser alvo de um estudo de medição de impacto social, cujos primeiros resultados foram apresentados no Fórum “Transição para a Reforma”, onde se destaca que:
Saiba mais sobre o projeto no nosso podcast ou entrevista com Maria Amélia Cupertino de Miranda
Fonte: FACM