Introduza o seu e-mail
Interesso-me muito por tudo que possa nos inspirar a construção de nosso bom envelhecimento, razão pela qual saber mais sobre as Blue Zones é algo que me desperta extrema curiosidade. Conhecer os estudos, explorar e vivenciar os ambientes onde vivem as pessoas centenárias traz-me intensa realização. São atividades alinhadas ao meu atual propósito de vida sênior: aprender e partilhar conhecimento sobre boas práticas para uma longevidade ativa e saudável.
Iniciei esta missão no ano passado quando explorei a ilha italiana Sardenha, a primeira região a ter esta designação, quando tive o privilégio de entrevistar o co-fundador das Blue Zones, o Professor Gianni Pes. Nestes link, poderá saber mais destas minhas experiências.
Neste ano foi a vez de conhecer a Blue Zone Ikaria e os segredos da longa vida daquele povo grego.
Acredito que já saiba o que são e onde estão localizadas as Blue Zones, entretanto, farei uma síntese para que se aproprie do assunto antes de ler o meu relato sobre Ikaria e, no final, possa adquirir conhecimento e inspiração para seguir as receitas de uma vida longeva do povo de Ikaria.
Blue Zones (zonas azuis) é um termo não científico dado às regiões geográficas que apresentam habitantes que atingem idades muito mais elevadas em comparação ao resto do mundo. São pessoas que vivem com mais de 90 e 100 anos.
O conceito das Blue Zones surgiu a partir do trabalho demográfico feito pelos pesquisadores Gianni Pes e Michel Poulain que identificou a província de Nuoro, na Sardenha, como a região com a maior concentração de homens centenários.
A partir do trabalho daqueles demógrafos, o jornalista Dan Buettner ampliou o alcance do termo ao publicar artigo na revista National Geographic, "The Secrets of a Long Life", em que incluiu outras 4 áreas de longevidade.
As 5 Blue Zones, descritas por Buettner são:
Situada no Mar Egeu Oriental, Ikaria tornou-se famosa em todo o mundo pela longevidade dos seus habitantes.
Segundo a mitologia, o seu nome deriva de Ícaro, o filho de Dédalo na mitologia grega e comumente conhecido pela sua tentativa de deixar Creta voando com asas feitas de cera de abelhas e penas. Antes da fuga, Dédalo alertou ao filho que não voasse muito perto do sol para que o calor deste não derretesse a cera das asas. No entanto, Ícaro não ouviu os conselhos do pai e tomado pelo desejo de voar próximo ao Sol teve as asas derretidas e caiu no mar Egeu, nas águas de Ikaria.
O acesso à ilha pode ser feito de avião, a partir de Atenas, ou por mar em um ferry. Ikaria está também ligada a outras ilhas por ferry, como Kos, Chios, Samos, Mykonos e muito mais! Saiba que a Grécia tem entre 1.200 e 6.000 ilhas, a depender do tamanho mínimo a ser levado em consideração. O número de ilhas habitadas é variado entre 166 e 227.
Ikaria é totalmente diferente das famosas e badaladas ilhas gregas. A paz reina em Ikaria.
As suas praias, montanhas, termas e aldeias só podem ser visitadas de carro. Há poucos táxis e o transporte público existente liga apenas a capital Agio Kirikos, no sul da ilha, e a cidade de Evdilos no norte. Na baixa temporada, quando lá estive, este transporte só ocorria duas vezes por semana.
Fui por via aérea a partir de Atenas e surpreendi-me ao ver apenas 10 ou 12 pessoas na aeronave. Ali, já começava a entender uma das razões da longevidade e espetacular qualidade de vida dos Ikarianos: a tranquilidade das suas aldeias.
Escolhi ficar em Evdilo, cidade ao norte da ilha, pois lá se concentra o maior número de pessoas lonvevas. Os especialistas ainda estudam este mistério uma vez que os habitantes do sul não têm diferenças dietéticas significativas em relação aos do norte que justifiquem esta situação. Nem a genética faria sentido comparar, já que há poucas chances de encontrar populações geneticamente isoladas em uma pequena ilha. Alguns atribuem esta discrepância às condições geológicas da região norte de Ikaria que contempla, inclusive, termas excelentes.
“Segundo dados demográficos, as pessoas em Ikaria vivem em média dez anos a mais do que as do resto da Europa e dos Estados Unidos. Aproximadamente um em cada três Ikarianos vive até os anos noventa.” https://greekreporter.com/2022/08/06/mystery-longevity-ikaria-greece/
Para a tão almejada visita contei com o apoio técnico de muitas pessoas que me apresentaram dados, história, paisagem, cultura, culinária e seniores fantásticos.
O povo grego, no geral, não fala inglês, fato que obrigou-me a recorrer as pessoas que lá conheci e que me ajudaram como intérpretes nos meus encontros com as pessoas seniores.
Explorei 70% da ilha, segundo Stelios, motorista particular experiente que conduziu-me pelas estradas estreitas e sinuosas da ilha.
Stelios é um profissional muito respeitado nos hoteis e lojas da ilha que o indicam a quem precise. Extremamente cuidadoso e comunicativo, forneceu-me informações; apresentou-me centenários e mostrou-me lugares relevantes para o meu trabalho, inclusive onde Ícaro caiu, segundo a mitologia grega.
Durante os trajetos, parava para colher e me mostrar plantas exclusivas da ilha e também levou-me conhecer pastores que conduziam as cabras nas íngremes montanhas de Ikaria.
Ikaria é repleta de figueiras. Elas estão nas ruas, nas montanhas e praças e enquanto floridas exalam um perfume adocicado que prevalece em toda parte. Durante toda a minha estadia senti aquele aroma delicioso que deixava aquela Blue Zone ainda mais deslumbrante.
Antes da viagem, pesquisei informações científicas e encontrei o Ikaria Study - um estudo do médico Christodoulos I. Stefanadis, da Escola de Medicina da Universidade de Atenas, que aborda a dieta e estilo de vida dos gregos longevos da ilha. O estudo concluiu que a dieta Ikariana inclui azeite, vinho tinto, peixe, café, chá de ervas, mel, batatas, feijão grão-de-bico, ervilhas, lentilhas e uma quantidade limitada de carne, açúcar e produtos lácteos, exceto leite de cabra.
Os dados deste estudo mostram que os habitantes super longevos daquela ilha conseguiram envelhecer com sucesso porque reduziram as disfunções emocionais e cognitivas das suas vidas, enquanto mantiveram a atividade física e a habitual “sesta” do meio-dia praticada por aquela população.
O envolvimento em atividades sociais e familiares também foram fatores que contribuíram para a longevidade dos Ikarianos pesquisados.
Ciente deste estudo, tratei de explorar a Blue Zone grega a fim de conferir, de perto, o estilo de vida daquele povo.
Tive o privilégio de participar de um Blue Zone Ikarian Kitchen Workshop, em uma das vinícolas mais famosas da ilha, a Kalimaris Ikarian Winery Farmhouse Restaurant, que inclui workshops, restaurante e acomodação. Destacada nos livros de Dan Buettner sobre a culinária das Blue Zones, este deslumbrante lugar conta com a experiência e gentileza da chef Eleni Karimalis, que nos ensina detalhamente e com muito carinho como elaborar as iguarias gregas.
Ao lado de um casal norte-americano, aprendemos fazer receitas que fazem parte da alimentação do povo centenário e, ainda, tivemos informações exclusivas sobre os hábitos dos familiares longevos de Eleni Karimalis.
Neste workshop, Eleni contou com o apoio do chef Vassilis.
Aprendi e fiz estas receitas tidas como “segredos da longevidade” da Blue Zone Ikaria:
Conhecidas e utilizadas desde a antiguidade, as fontes termais de Ikaria são classificadas como as mais radioativas do mundo e são classificadas como superaquecidas. As temperaturas variam de 31°C a 58°C. São localizadas principalmente nas costas sudeste e nordeste da ilha.
Vale a pena mencionar que a quantidade de fontes radioativas em Ikaria é maior do que em outros países. Dos tempos antigos aos modernos, houve muitos estudos sobre os efeitos benéficos à saúde das fontes termais de Ikaria, fato que leva alguns pesquisadores atribuírem a excepcional longevidade daquele povo às condições geológicas da ilha.
Visitei e experimentei as termas salgadas e públicas da cidade de Therma e energizei-me como uma Ikariana. Em Ikaria, como os Ikarianos.
O café na Grécia é uma grande parte da cultura grega. É muito mais que uma simples bebida - é um pretexto para encontrar amigos e discutir a vida cotidiana ou os assuntos sérios. https://realgreekexperiences.com/coffee-in-greece
Levem o tempo que quiserem, os gregos sentam-se nas tranquilamente nas cafeterias das praças de Ikaria e lá ficam. Muitos jogam gamão e nas mesas ficam leve o tempo que o jogo levar.
O curioso é que não são convidados a saírem caso não consumam nada além do café. Afinal, a vida sem pressa é uma das características e um dos segredos da ilha de viver bem até os cem, ou mais.
Por indicação recebida em Evdilos, logo na chegada em Ikaria conheci uma cidadã que se propõe a mostrar a ilha e pessoas com mais de 90 anos de idade, mas mediante o pagamento de preços exorbitantes. Surreal! Cobrava 400 euros para mostrar a ilha e oferecia a possibilidade de conhecer uma pessoa idosa mediante o pagamento de 100 euros que, segundo ela, iria para a pessoa senior. Pareceu-me abusivo e não aceitei.
Além do mais, aprendi com o Professor Gianni Pes que as investigações, “apesar de serem valiosas para tornar estas populações extraordinárias conhecidas fora da comunidade científica, devemos garantir que se trata com respeito os idosos frágeis, tentando interferir o menos possível na sua vida quotidiana.” Felizmente, assim como na Sardenha, conheci alguns centenários, espontaneamente, que conversaram comigo e contaram um pouco de suas vidas e costumes.
Posteriormente, soube que a tal cidadã é conhecida na ilha por tal prática de cobrança abusiva por serviços prestados a estrangeiros que lá vão a fim de conhecerem a Blue Zone e os seus centenários.
Um fato surpreendente entre as pessoas super longevas da Blue Zone Ikaria: os anciãos não gostam de falar com jornalistas porque depois dos primeiros, à época da primeira divulgação sobre as Blue Zones, muitos anciãos morreram após serem entrevistados.
Passaram a atribuir aos jornalistas um “mau olhado”, “bad eye”, superstição que os faz evitar o contato com eles.
Confirmei tal informação com várias pessoas do município de Evdilos, Armenistis e Agios Kirikos.
O Senhor Dimitri, 89 anos, empresário e muito comunicativo (em inglês, felizmente) veio ao meu encontro curioso em saber o que uma brasileira, sozinha, fazia em sua cidade. Contei o meu propósito e ele logo tratou de contar-me a sua história no estrangeiro e sobre a sua disposição em empreender na ilha.
Conversei com o Pater Christós, 99 anos, padre da igreja ortodoxa, é conhecido na ilha e foi muito acessível comigo. Ficou feliz ao saber que sou brasileira e disse-me que é muito feliz na aldeia onde vive.
Soube da senhora Rosali, de 90 anos, que andava 10 km por dia nas montanhas para alimentar os seus animais.
Nesta minha exploração na famosa ilha grega, conheci Lucia, empresária brasileira residente em Ikaria há 22 anos, desde antes da categorização como Blue Zone e com muitas histórias para contar.
Lucia permitiu-me um especial olhar sobre a longevidade local – um olhar sob a ótica de uma brasileira imigrante, sensível e atenta à vida social de seus parentes e amigos gregos. Lúcia foi entrevistada pelo Globo Repórter em 2013 em programa que tratou da longevidade local. Em sua loja, atua como esteticista, na venda de produtos de beleza, souvenirs e outros bens de interesse da população e visitantes.